Uma relação de “dívida” com os pais. Faz muito tempo que Mariana ajuda os pais financeiramente, e as reclamações da mãe por mais dinheiro dominam a relação. Recentemente a analisanda descobriu que o pai está com uma doença grave. Ela está preocupada com a saúde dele, claro, mas outras preocupações rondam.
Atendendo a esses pedidos – e com forte sentimento de culpa quando não o faz – Mariana se endividou. Não uma dívida qualquer, comprometeu-se com empréstimos bancários que chegaram a ameaçar sua subsistência: mudou-se para uma casa bem menor, com aluguel que poderia pagar e passou a consumir alimentos mais baratos.
Na terapia, trabalhamos a relação com a mãe. Essa relação sugava suas forças, inclusive físicas. Após falar com a mãe ao telefone, ficava horas deitada sem se mover, sem se alimentar, de tão enfraquecida que se sentia. Passava a semana se sentindo estranha, passava da hora de comer, ficava aérea no trabalho.
Essas ligações telefônicas eram a ocasião da mãe reclamar da vida, falar o quanto tudo estava tão difícil e, invariavelmente, arrumava algum modo de culpar a filha pela situação que vivia e finalizava a ligação pedindo-lhe mais dinheiro. Mariana não sabia direito o que a mãe fazia com as quantias repassadas, a mãe sempre alegava alguma urgência financeira que precisava ser atendida.
Um momento importante na terapia foi quando Mariana compreendeu que sua relação com a mãe era uma relação endividada, e que por mais intenso que fosse o fluxo financeiro, a dívida nunca diminuía ou se pagava. Era uma dívida impagável!!
Uma relação endividada! E impagável! Entendendo que era impagável, ela pôde desistir! E isso foi libertador. A relação mudou, não por compreensão ou mudança de atitude da mãe, mas da analisanda. A culpa não mais ressoava nela.
Mas agora com o pai doente, a mãe investiu na relação endividada para que Mariana pagasse altos custos de tratamento, mesmo que o pai tivesse conseguido acompanhamento médico num dos melhores hospitais públicos do país, uma referência inclusive internacional. A analisanda temeu ceder nos avanços que tinha feito, mas conseguiu, a culpa não lhe capturou.
Já pensou que você também pode ter relações endividadas, em que o fluxo de energia, de tempo, de atenção segue forte na direção daqui pra lá? E mais, relações em que o que você dá nunca parece ser suficiente? Pense nisso!